domingo, 25 de janeiro de 2015

Eu não preciso ser (nem me sentir) linda

Acho curioso e triste que, quando se trata de “libertar” as mulheres dos padrões de beleza quase impossíveis que a mídia retrata, a estratégia feminista padrão seja “não acredite nisso, você também é LINDA”. Sério? Viramos criancinhas de novo, quando nossos pais achavam nossos rabiscos lindos?

 

O caso abaixo, um post recente no Facebook, é apenas um exemplo do modo como muitas feministas pensam sobre a questão da beleza:


Em primeiro lugar, eu também acho admirável a atitude dessa moça: mesmo sabendo que não se enquadrava no "padrão", ela quis participar do concurso, ligou o foda-se e foi. Palmas pra ela. Mas o meu foco aqui é a atitude feminista diante do tal "padrão de beleza", e se essa atitude realmente ajuda as mulheres. Uma coisa é certa: mesmo se a moça de biquini fosse muito mais gorda, a reação das feministas ainda seria a mesma. Por que isso? Será que toda mulher tem que se achar linda, e as outras mulheres têm que dizer que ela é linda? A tal "sororidade" feminista exige isso?

Quando estamos lidando com crianças, eu entendo perfeitamente a prática de incentivar ao máximo, de dizer que a criança é linda e que o desenho dela é lindo. Também entendo perfeitamente a importância da auto-estima para pessoas de qualquer idade, mas será que não tem uma maneira mais adulta de melhorar essa auto-estima, que não seja simplesmente distorcendo a realidade com óculos cor-de-rosa? Até quando vamos preferir alterar o significado das palavras para agradar todo mundo?

Isso vale para outras qualidades humanas também. Há quem diga que não existe burrice, que todo mundo é inteligente. Será mesmo? Será que todo mundo é alto também? E engraçado? E rico? Não é melhor esquecer essa palhaçada e admitir que as pessoas variam em todas as características imagináveis, e que isso não é um problema? Ninguém é menos humano por causa dessas diferenças!

Então vamos parar de tentar redefinir as palavras. Todo mundo sabe que "bonita" e "linda" se referem à beleza física. E essa beleza simplesmente NÃO é tão relativa assim: quase todo mundo concorda ao classificar uma pessoa como bonita, feia ou normal. Se levarmos um turista alemão para uma tribo de índios e pedirmos para ele apontar as índias mais bonitas, provavelmente serão as mesmas que os homens índios teriam escolhido. A questão nunca foi "vamos acabar com esses padrões arbitrários de beleza, agora TODO MUNDO VAI SER LINDA!". O que é isso, comunismo estético? Não vai funcionar, sinto muito. Beleza e feiúra não foram inventadas pelo "patriarcado", elas sempre existiram no mundo real.

A questão é que as mulheres não precisam ser julgadas SÓ por essa característica! Ninguém precisa ser linda, NEM SE SENTIR LINDA, pra se amar e ser feliz! Por que nunca ouvimos “homem, não acredite nos padrões de beleza, você também é lindo”? Porque a beleza física não tem essa centralidade toda na vida dos homens. Claro que quase todo ser humano gostaria de ser mais bonito (e mais saudável, mais inteligente, mais rico..), mas os homens simplesmente não precisam se sentir bonitos para serem felizes! Então por que diabos as mulheres precisariam se sentir bonitas?

Isso sim me parece um resquício de uma sociedade machista, em que o papel da mulher era só o de esposa/mãe. Beleza física é importante, e claro que ela pesa na escolha de um(a) parceiro(a). Se você é bonita, ótimo, aproveite as vantagens que isso traz. Mas se você não é bonita, ainda é possível se destacar e ser respeitada por muitos outros motivos: inteligência, competência profissional, bom humor, riqueza, honestidade, simpatia, etc. A auto-estima feminina não precisa vir de uma única característica. As feministas entendem isso muito bem, mas às vezes falta coerência.

Se continuarmos colocando “ser linda” e “se sentir linda” como ideais - e até direitos - das mulheres, que mensagem estamos passando? Ser linda pra quê, afinal? Pra conquistar um homem??? Não consigo ver coerência em, por um lado, tentar “desconstruir” os padrões de beleza que “oprimem” as mulheres (uma causa nobre, embora utópica) e, por outro, reforçar a centralidade da beleza física na vida delas, com esse populismo barato de “você é linda, amigaaaa”. Ah, você não estava falando da beleza física? Então comece a usar outras palavras, mais específicas para a qualidade que você deseja elogiar... amiga, você é tão engraçada, inteligente, bondosa, meiga, forte, agradável, corajosa, competente, ética, justa, solidária, empática, calma, criativa, educada e alegre!

E não adianta culpar a mídia e a cultura machista pela centralidade da beleza na vida das mulheres. Mídia vive de dinheiro, ela é muito mais reflexo que causa dos padrões vigentes na sociedade. Se o povo quer ver mulheres magras e peitudas na TV, é isso que vai passar na TV, simples assim. Não é batendo de frente que vamos conseguir mudar os padrões de beleza e, mais importante, não é preciso mudar padrão de beleza nenhum (seria bom, mas não necessário). A mudança que eu defendo é pessoal, uma mulher por vez. Deixa o padrão de beleza existir, você não é obrigada a seguir. Você não é obrigada a ser bonita, e não é obrigada a se sentir bonita. Por acaso a mulher baixinha deveria se sentir alta só porque isso, em teoria, melhoraria sua autoestima? Claro que não, é muito mais saudável que ela tenha uma visão realista da sua estatura. Tudo bem se ela disser que gostaria de ser mais alta, ou se ela usar saltos enormes para se sentir mais alta.. mas alguém aconselharia essa pessoa a acreditar firmemente que ela já é alta, a despeito do que a fita métrica diz? Pois bem, o espelho é quase tão preciso quanto a fita métrica, e as pessoas simplesmente sabem quando são ou não bonitas. Ficar se iludindo - ou tentando iludir os outros - sobre beleza é quase tão louco quanto se iludir sobre estatura.

Ah, antes que eu me esqueça: por que diabos algumas feministas sonham em abolir os concursos de beleza? Alguém força as modelos a participar disso? Feminismo existe para AUMENTAR a liberdade das mulheres, nunca para restringir suas opções. Algumas mulheres adoram mostrar sua beleza, competir usando a beleza, e tem empresas dispostas a patrocinar esses eventos, então qual o problema? (Se você for contra usar dinheiro público nesses eventos, aí sim sua reclamação faz sentido, mas por motivos bem diferentes). E eu preciso ficar deprimida ao ver que existem mulheres muitíssimo mais bonitas do que eu? Fala sério. Um feminismo que trata as mulheres como crianças, incapazes de encarar a realidade de frente, não "empodera" ninguém e não serve pra muita coisa.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Mais reflexões sobre “culpar a vítima” e o modo de se vestir



A ortodoxia feminista diz que “culpar a vítima” faz parte de uma estratégia de dominação. Seria uma maneira de manter as mulheres “na linha”, de aproveitar cada notícia de estupro ou assédio como um alerta moralista,  “tá vendo, filha, você também não devia andar se mostrando tanto por aí..”. E essa acusação das feministas até faz sentido. Embora seja difícil de quantificar, é inegável que boa parte dos homens (e das mulheres) têm um interesse real em fiscalizar a vestimenta alheia. Mas isso não significa que eles estejam totalmente errados, que não haja um fundo de verdade, e uma preocupação sincera com a segurança das mulheres. Ora, alguém acha realmente que um pai, por mais machista e conservador que seja, está mais preocupado em “oprimir o gênero feminino” do que com a segurança da filha?

OBS: Aqui é importante diferenciar estupro do que estou chamando de assédio. Entenda "assédio" como "assédio verbal na rua, cometido por desconhecido". A questão do estupro é mais complexa e não será tratada neste post.

Tão importante quanto tentar diminuir a incidência de assédio no futuro (denunciando, educando melhor as crianças, fazendo campanhas, etc) é reduzir o risco de assédio para cada mulher que sairá à rua amanhã.  A estratégia feminista de “foda-se, posso me vestir como quiser” pode beneficiar a sociedade no longo prazo, mas ao custo de aumentar o risco e o aborrecimento cotidiano para a mulher que vive por esse mantra. Não estou dizendo que a feminista que pensa e age desse jeito esteja errada. Ela tem todo o direito! Só acho que ela não deveria sustentar sua filosofia em mentiras. Não diga que você se veste como quer porque “isso não influencia em nada na questão do assédio”. Diga que você entende que pode estar aumentando seu risco, mas que sua liberdade e sua consciência são mais importantes.

Muitas feministas adoram se iludir com exemplos anedóticos do tipo: “todas as vezes que eu fui assediada na rua ou no ônibus, estava com roupas normais! Esse papo de que roupa provocante aumenta o risco é uma mentira”. Esse raciocínio é muito frequente e aparentemente lógico, mas uma analogia simples nos ajuda a entender o erro. Pense no cinto de segurança. Sabemos que, entre os motoristas, a grande maioria usa o cinto. Mesmo assim, muitos motoristas morrem em acidentes de trânsito. Inclusive, a maioria dos motoristas mortos no trânsito estava usando cinto! Será que alguém concluiria, a partir desses fatos, que o cinto de segurança é inútil? Claro que não! Então será que faz sentido concluir que, só porque os casos de assédio que você tem conhecimento foram com “roupas normais”, o tipo de roupa não influencia no risco de assédio? Ora, pela própria definição de “roupa normal”, é esse tipo de roupa que a maioria das mulheres vai vestir a maior parte do tempo... e é normal que a maioria dos assédios ocorra justamente com roupas normais! Isso não nos diz NADA sobre o quanto de assédio uma mesma mulher sofreria SE estivesse usando roupas provocantes todo esse tempo. É óbvio que ela teria sofrido muito mais assédio.

Ninguém está dizendo que usar roupas normais, ou mesmo ultra-recatadas, vai te imunizar contra assédio e estupro (assim como o cinto de segurança não imuniza ninguém de morrer num acidente de carro); e ninguém têm os dados necessários para saber o QUANTO a roupa influencia na chance de ser assediada/atacada/estuprada. Algumas feministas, convenientemente, apontam para essa falta de estatísticas que apoiem a relação roupa-assédio. Tudo bem, mas isso vale para os dois lados. Onde estão as provas de que “a roupa não influencia”? Ora, é essa posição que mais precisa de evidência estatística, porque desafia o senso comum e até a lógica. Desafia a lógica porque a função da roupa sexy é justamente chamar a atenção, atrair olhares. Seria muito estranho que esse tipo de roupa conseguisse provocar apenas mais olhares, e não mais assédio.

No fim das contas, a decisão de como se vestir – ou, mais genericamente, de como agir perante a sociedade escrota em que vivemos – é estritamente pessoal, não existe uma maneira “certa” de encarar a questão. A mulher que decide “se reprimir” para diminuir seu risco (vestindo-se de maneira mais conservadora do que gostaria) não é fraca nem menos feminista por isso; ela pode estar apenas sendo racional e prudente, ela pode valorizar mais a paz de espírito que a liberdade. Da mesma forma, o pai que aconselha a filha a não usar roupas curtas não é necessariamente machista e controlador (e, mesmo que seja, a preocupação com a segurança da filha não deixa de ser válida). Você é livre para se vestir como quiser, mas é melhor fazer isso baseada nas razões certas, não em mitos bonitinhos criados pelo feminismo. Não deixemos a ideologia nos cegar para o mundo real. 

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Crenças feministas que eu abandonei: uma carta de término com o feminismo

Por Rachael Lefler (artigo traduzido do original em inglês)

Quando as pessoas escrevem este tipo de post, como o artigo de Salon sobre por que o autor deixou o Partido Republicano, muita gente responde questionando se eles eram “realmente” o que dizem ter sido. Para mim, isso é como a falácia do Escocês Verdadeiro, que diz que nenhum Verdadeiro X pode deixar de ser X e virar outra coisa. Acho que muito disso tem a ver com a forma como os humanos são socialmente preparados para criar preferências no seu grupo e preconceitos sobre outros grupos. Quando alguém abandona nosso grupo e passa a ser um “deles”, frequentemente suspeitamos de que ele fosse um falso amigo ou um espião do outro grupo desde o começo. A História está cheia de exemplos assim, bem como a literatura, e não vou te entediar com isso.

Mas a verdade é que as pessoas são mais complicadas que isso. Eu valorizo a verdade e a racionalidade acima de qualquer preocupação com lealdade a alguma marca ou grupo de pessoas. Lealdade, na minha experiência pessoal, é usada muitas vezes para silenciar a verdade ou para atacar pessoas que disseram a verdade.

Nenhuma quantidade de evidência poderia satisfazer as pessoas que dirão que eu nunca fui uma “verdadeira” feminista. Eles dirão que “ela nunca castrou ninguém”, “nunca fez protesto de topless”, “ela nunca tirou um pergaminho da vagina durante uma performance artística”, sendo assim ‘ela nunca foi uma VERDADEIRA feminista”.

Basicamente, eu era apenas uma liberal (NT: “liberal” nos EUA corresponde a  “esquerdista” no Brasil), e o feminismo era apenas outra maneira de dizer que eu rejeitava o preconceito e a intolerância. Eu comprei a ideia de que feminismo significava apenas igualdade de gênero, e eu achava que qualquer pessoa decente deveria concordar com a igualdade entre os sexos em termos de poder político. Eu pensava que as mulheres precisavam de uma representação melhor na mídia sexista, o que se refletiu em alguns dos meus primeiros artigos (por exemplo este e este).

Acho que eu disse muitas verdades naqueles artigos, mas não vejo mais o mundo com as lentes da teoria do patriarcado, e me afastei das atitudes feministas em muito do que eu penso agora. Principalmente, eu acho que o maior mito feminista é que homens e mulheres não são muito diferentes em suas estruturas psicológicas inatas. Sendo assim, tudo – tudo MESMO – que as mulheres fazem e os homens não, ou vice-versa, é criticado como resultado de um cultura sexista, e não como o que essas coisas realmente são: diferenças biológicas entre os sexos. Veja bem, a biologia dos sexos não se resume a “algumas pessoas têm pênis, outras tem vaginas”. Ela realmente impacta tudo no ser humano, desde o crescimento de pelos, estrutura óssea e muscular até, isso mesmo, traços comportamentais. E, para mim, é simplesmente desonesto quando as feministas colocam tudo sob o guarda-chuva da teoria do patriarcado, quando existem diferenças sexuais na psicologia e comportamento. Eu não acho que essas diferenças devam resultar necessariamente em discriminação; na verdade, eu acho que por causa dessas diferenças, homens e mulheres complementam um ao outro e deveriam compartilhar o poder igualmente na sociedade.

Você poderia pensar que só essa crença - de que homens e mulheres deveriam ter o mesmo poder político -  já me torna automaticamente feminista, mas não é assim. Isso me leva à primeira crença feminista da qual discordo.

Feminismo quer apenas igualdade de gênero

Você não imagina quantas vezes eu discuti com feministas e ouvi isso, e mesmo quantas vezes eu defendi isso COMO feminista. Essa frase virou basicamente uma resposta-clichê para qualquer ocasião em que uma mulher, ou qualquer pessoa, critica o feminismo. Elas apontarão para a definição dicionarizada de feminismo e dirão “ei, se você acha que homens e mulheres merecem igual tratamento perante a lei ou direitos políticos iguais, você já é feminista!”

Para mim, isso é tão idiota quanto dizer que “O ISIS segue o Islã, se você segue o Islã, parabéns, você já é membro do ISIS!”. Se o feminismo só quisesse igualdade de gênero, eu acho que mais de 90% das pessoas seriam feministas. Só que feminismo descreve posições em muitas questões políticas. Eu costumava gostar da feminista Jessica Valenti pelo livro “He’s a Stud, She’s a Slut” (Ele é um garanhão, ela é uma puta), que trata do duplo critério baseado em gênero tão comum na sociedade. Mas a Jessica NÃO acha que feminismo significa igualdade, e quando você lê blogs feministas ou assiste vídeos feministas no YouTube, fica evidente que não é disso que se trata.

Feminismo é uma ideologia e uma visão de mundo. Ele rejeita pessoas que não concordam com a maioria em questões como abordo, controle de natalidade financiado pelo Estado, teoria do patriarcado e pessoas que, como eu, pensam que as questões de gênero refletem diferenças biológicas, e não a crença feminista oficial de que qualquer diferença de gênero é causada pela opressão. O feminismo rotula as mulheres como oprimidas, mas ignora quando o sexismo impacta negativamente os homens. Vai ver os homens são tão burros que vivem oprimindo a si mesmos. Bobinhos.

Eu também não gosto como o feminismo moderno tenta se legitimar através das preocupações legítimas que existem (ou existiram) em outros lugares e épocas. Se você viajar no tempo ou olhar para países muito pobres e em guerra, com certeza vai ver muitas mulheres sendo de fato oprimidas. Em primeiro lugar, isso não tem nada a ver com o feminismo atual no Ocidente. Segundo, eu diria que os homens nessas outras sociedades são tão oprimidos quanto as mulheres, se não forem mais. Veja bem, quem é oprimido no Afeganistão, as mulheres que vestem burca por medo dos radicais islâmicos ou os homens que são pressionados a se envolver diretamente na luta armada? Sou muito grata às gerações passadas de feministas que lutaram pelo meu direito de vestir calças, votar e ir para a faculdade. Sou especialmente gratas às mulheres durante a Segunda Guerra que provaram que as mulheres eram capazes de trabalhar nas fábricas.

No entanto, eu não gosto que a menção de todas essas coisas que devemos às gerações PASSADAS signifique que devemos aceitar o feminismo no atacado hoje. Até porque também houve males causados pelas feministas ao longo da História, como a legitimação da promiscuidade, ataques à família nucelar e o aumento no índice de divórcio. Eu particularmente acho que o feminismo é uma das principais razões que levou a cultura pop americana a seu atual estado trash. Então não, eu acho que é totalmente ridículo insistir que eu ou qualquer pessoa deve se rotular como “feminista” simplesmente por defender a igualdade de gênero. Eu e acho até que, na nossa sociedade, para realmente defender a igualdade entre os gêneros seria melhor militar pelos direitos dos homens. Definir seus termos de uma forma que qualquer um que discorde pareça um babaca é desonestidade intelectual.

Teoria do Patriarcado


"Você vive usando essa palavra. Eu não acho que ela signifique o que você acha que significa."

Patriarcado é uma palavra usada direto nos círculos feministas. Meu lado cínico me diz que pode ser só um termo que inventaram para calar as acusações de que elas odeiam homens. “Não, nós não odiamos homens, odiamos o patriarcado”. Também ligada a essa visão está a ideia de que mulheres não-feministas estão “participando” do patriarcado, seja lá que merda isso signifique, uma mentalidade altamente “ou está conosco ou contra nós” em relação às mulheres. Isso vindo de um movimento de libertação das mulheres, supostamente. Elas não querem a sua liberação, querem seu sofrimento. Querem se masturbar com sua dor de vítima patética do “patriarcado”.

Quem me conhece bem sabe que detesto teorias da conspiração. Elas se tornaram tão comuns na nossa cultura porque as pessoas querem algo externo para culpar pelas coisas que deram errado na sociedade, como o 11 de setembro, guerras, economia em declínio, perda de liberdades e crises ambientais. Todo teórico da conspiração faz isso e, para mim, acreditar que o patriarcado está por trás de todos os problemas afetando mulheres e meninas não é tão diferente de botar a culpa da nossa crise econômica nos judeus. Ambas as explicações pegam um grupo que não tem nada a ver com a história e o usam como bode expiatório.

As feministas dizem que culpar o patriarcado não é culpar os homens. Sério? A palavra patriarcado, etimologicamente, deriva de “pai”, e descreve qualquer sociedade em que os homens têm a maioria do poder político. A questão é que quase todas as sociedades, do passado e do presente, foram patriarcados, apesar das diferenças culturais, e me parece que isso prova que os homens são simplesmente mais dominantes e predispostos a buscar liderança política que as mulheres, que parecem, em todas as culturas, preferir exercer uma liderança privada e doméstica. A explicação para isso não tem a ver com uma conspiração alienígena, mas sim com biologia; mulheres têm os bebês, bebês precisam ser alimentados e cuidados em casa, homens tem que sair para pegar comida e proteger a mulher e o bebê.

(...)

Enfim, eu considero que a teoria do patriarcado faz uma série de afirmações amplas que não são corretas, então o cerne do pensamento feminista está comprometido por uma lógica falha. Ele se baseia no pensamento marxista sobre classe, mas no lugar da burguesia oprimindo o proletariado, é a classe dos homens oprimindo a classe das mulheres. Isso cria generalizações e não permite nuances ou exceções. Também desconsidera as mulheres que tiveram e continuam a ter influência polítca. A teoria também usa opressão como um modelo para explicar comportamentos que, na minha opinião, tem mais a ver com características biológicas.

Cultura do estupro

Um dos primeiros abalos no meu feminismo foi ver a reação feminista exagerada à canção “Blurred Lines”. Tudo bem, eu não gosto dessa música e acho ela bem idiota. Mas o fato é que era apenas mais uma de muitas músicas pop idiotas, nem melhor nem pior que as outras.

Mas não foi assim que as feministas de vários sites na internet entenderam. Elas escreveram páginas e páginas iradas sobre como a canção de alguma forma promove o estupro, ou pelo menos questiona o ideal feminista sobre consentimento – que deve ser sempre sóbrio e firmemente estabelecido, do contrário o sexo será estupro.

Ora, eu acho que é importante que o sexo seja consensual. E ninguém realmente apoia o estupro, exceto alguns indivíduos doentes que provavelmente não estão lendo isso porque estão na cadeia agora. Mas será que uma música como “Blurred lines”promove o estupro?

Eu acho que não. Trechos como “I know you want it, but you’re a good girl” são considerados “problemáticos” por algumas mulheres, mas para mim eles significam apenas que a mulher da canção provavelmente deu pistas não-verbais de flerte/interesse sexual, e a letra não diz, importante destacar, nada sobre forçar uma mulher a ir pra cama com o cantor POR CAUSA desses sinais. Consentimento verbal é ótimo, mas insistir nisso ignora o fato de que sexo envolve sensação, olhar, linguagem corporal, hormônios e feromônios em primeiro lugar, e em segundo a parte verbal. Eu não tinha percebido até então o quanto o feminismo gira em torno e depende de nós mulheres ficarmos eternamente espantando o medo de estupro. Inúmeros casos me mostraram que essa hipersensibilidade a tudo considerado “estupro” parece cada vez menos uma preocupação com as vítimas reais - especialmente quando são homens, totalmente ignorados por essa teoria –e mais com uma desculpa para manter as mulheres com medo dos homens o tempo todo. Se a sua frescura não tiver limite, qualquer coisa pode ser chamada de estupro. As feministas não se cansam de falar sobre estupro, como se ele estivesse em toda parte. Elas até inventam estatísticas mentirosas para fazer parecer que um número assustador de mulheres serão estupradas em algum momento da vida.

Mais sobre como a “cultura do estupro” não tem nada a ver com apoiar as vítimas reais de estupro pode ser visto aqui (http://www.avoiceformen.com/feminism/feminisms-mythological-rape-culture/ ). Basicamente, esse autor compartilha minha crença de que a “cultura do estupro” foca apenas numa relação binária, em que os homens são sempre os perpetradores e as mulheres são sempre apenas vítimas. Esse não é o mundo em que vivemos. 

A diferença salarial entre os gêneros é causada por sexismo

A DIFERENÇA SALARIAL. Uma das maiores mentiras inventadas pelas feministas

Longe disso. A diferença salarial entre os gêneros desaparece quando você realmente olha – como as feministas dizem – para mulheres e homens que fazem o mesmo trabalho. Aquele papo de que “mulheres ganham 77 centavos para cada dólar que os homens ganham” NÃO estava considerando mulheres que fazem o mesmo trabalho que homens e descobrindo que elas ganhavam menos por serem mulheres. Acontece que as mulheres escolhem trabalhos que são geralmente em ambiente coberto, doméstico e atividades como pedagogia, biblioteconomia e enfermagem, enquanto os homens tendem a escolher mais trabalhos ao ar livre, envolvendo mais força física e risco de acidente, pelos quais eles recebem mais, mas sofrem taxas muito mais altas de acidentes e mortes no trabalho.

"Mas como ousa um pescador de caranguejo ganhar mais que uma bibliotecária?"

Seja como for, vários estudos já refutaram o argumento da diferença salarial, então não vou perder muito tempo com isso. Mesmo o ultra-liberal Huffington Post fez um artigo sobre isso. É tão óbvio que a tal diferença salarial não é um problema real. E se fosse, será que as empresas não contratariam mais mulheres e evitariam os homens, já que poderiam cortar gastos se as mulheres aceitassem mesmo ganhar menos? Outra verdade inconveniente para as feministas é o fato de as mulheres fazerem escolhas diferentes no balanço vida pessoal x carreira, preferindo mais tempo com a família a longas horas de trabalho. Se algum sofre de expectativas sexistas, são os homens, com a expectativa de que eles devem ser máquinas de trabalho que não precisam de vida familiar nem descanso, porque pedir isso aos chefes faz os homens parecerem fracos, mas para as mulheres já é algo perfeitamente natural.

Além disso, segundo uma matéria que ouvi na NPR sobre uma mulher que trabalha num alto cargo em Wall Street, as mulheres ganham menos bônus que os homens porque elas simplesmente não os pedem com tanta frequência ou com tanta cara-dura quanto os colegas homens. Isso não é cultura sexista, são impulsos biológicos. Os homens sentem necessidade buscar mais e mais dinheiro, e as mulheres podem ajudar nossa sociedade obcecada por dinheiro porque elas parecem se contentar com menos e entendem a necessidade de conciliar trabalho e vida pessoal. Mas não escolha tirar mais tempo de folga e pedir menos aumentos e depois venha culpar o sexismo por seu colega ter ganho um aumento que ele PEDIU, enquanto você não ganhou um aumento que você NÃO pediu, ok? Simples. 

Sexismo é o motivo pelo por que há poucas mulheres em engenharias e ciências exatas

"Devia haver mais mulheres em matemática e ciências". Formou-se em Estudos Feministas.

Essa questão remete ao debate natureza x educação. As feministas querem te convencer de que o patriarcado ou o sexismo é o que faz as mulheres escolherem, de modo geral, ir para as ciências humanas e sociais, em detrimento das ciências exatas.

Isso me irrita por duas razões. Primeiro, feminismo é sobre escolhas e liberdade para as mulheres, então por que reclamar de mulheres fazendo escolhas “erradas”? Segundo, isso reforça o mito, comum na nossa sociedade, de que os diplomas em humanidades e ciências sociais valem menos que os diplomas em tecnologia e engenharia. Se eu estou numa depressão, não vou consultar um bacharel em ciência da computação. Se eu quero encontrar a solução para o conflito Israel-Palestina, provavelmente não ligarei muito para que os matemáticos têm a dizer sobre o assunto. Nós temos essa crença na tecnocracia, vemos a ciência e a tecnologia como uma panaceia, mas eu acho que não são, e que existem inúmeras utilidades nas ciências humanas. 

Novamente, eu acho que isso é um caso de naturezas diferentes, mas complementares, de homens e mulheres. Mas as feministas veem essa divisão de áreas por gênero e pensam que ela não é resultado de preferência diferentes, mas sim de uma socialização desigual. “Meninas são socializadas para não querer ser engenheiras pelo fato de que os Legos são vistos como para meninos”, elas reclamam. Acontece que eu brincava com Lego e outros brinquedos de construção, e nem por isso me tornei engenheira. Legos são de gênero neutro, não “masculinos”. (voltarei à questão dos brinquedos mais tarde, é um dos tópicos feministas que realmente me irrita)

Outro problema é que esse mito enxerga as mulheres como tendo mentes tão fracas que podem ser dissuadidas de perseguir seus sonhos por causa do sexismo. Isso ignora a coragem de mulheres que realmente fizeram coisas incríveis nas áreas tidas como masculinas, e assume que as mulheres podem ser psicologicamente demolidas por qualquer coisa remotamente ofensiva, como uma camisa.
 
Deveríamos poder vestir o que quisermos sem sermos objetificadas. Pousou uma nave num cometa. Forçado a se desculpar porque sua camisa ofendeu feministas.

Essas coisas me deixam louca, preciso de uma pausa para gatinhos. 

Ah, bem melhor.



A sociedade marginaliza e subestima a violência contra mulheres

Como na “cultura do estupro”, esta alegação feminista diz que a sociedade possui um preconceito oculto ou misoginia que faz as pessoas não respeitarem mulheres vítimas de violência ou não as levarem tão a sério. Mas o modo como a mídia e a sociedade estão estruturadas (com muito mais abrigos para mulheres vítimas de violência que para homens na mesma situação, por exemplo) aponta justamente para o contrário. (...) 

De fato, o que eu vejo acontecer é o oposto: vejo homens que são atacados por mulheres sendo chamados de “viadinhos”, ou seja, tendo sua masculinidade questionada, mas mulheres que são atacadas por homens são vistas como “sobreviventes” e – simultânea e paradoxalmente – como “vítimas caladas da opressão”... sei, como se alguém as estivesse silenciando, quando elas estão por toda parte na internet e nos noticiários. Acabo de assistir um especial de uma hora da CNN sobre as mulheres que estão acusando o ator Bill Cosby de estupro. Ninguém está silenciando ou marginalizando essas mulheres, a maioria das pessoas está é parabenizando elas pela coragem de finalmente vir a público contar em detalhes embaraçosos suas lembranças traumáticas. Mas a narrativa feminista é que as mulheres têm que sempre, em todos os casos, ser VÍTIMAS. 

Isso leva as feministas a:
  1. Ignorar e marginalizar casos em que a vítima é homem, muitas vezes ridicularizando sem piedade esses homens (como neste vídeo.)
  2. Ignorar e marginalizar casos em que uma mulher comete a agressão, chegando até ao ponto de apoiar a agressora (também está no vídeo acima).
  3. Apoiar atitudes sexistas, paradoxalmente, sobre como as mulheres são vítimas e os homens são os valentões agressivos. 

Basicamente, a teoria feminista se apoia no padrão homens=culpados e mulheres=vítimas. Nos casos em isso está invertido, as feministas ainda encontram um jeito de culpar os homens ou o “patriarcado” pela vitimização masculina ou, mais frequentemente, elas simplesmente ignoram esses casos como meras exceções da regra geral. Mas deveria ser óbvio que, provavelmente devido a diferenças biológicas, as pessoas em geral têm mais empatia pelas mulheres que pelos homens, e essa habilidade feminina de inspirar empatia não é algo que devemos ao feminismo.

Gênero não tem relação com o sexo biológico

Cortar metade do cabelo. Desenhar um bigode em metade do rosto. Porque o patriarcado!

A teoria de gênero propagada pelas feministas mainstream atuais diz que não existe base biológica para os gêneros; que é tudo uma questão cultural, e que o sexo físico não determina o gênero cultural. Acontece que, para a grande maioria das pessoas, seu sexo biológico também determina muitas das suas características psicológicas inatas. Eu sei que existem pessoas com diversos distúrbios que não possuem sexo, ou possuem algum intermediário entre os dois sexos normais. Mas dizer que isso invalidade a ideia de que sexo existe é como dizer que, já que existem muitos distúrbios neurológicos, você não pode criar um teste de inteligência, porque a pessoa a ser testada pode ter um desses distúrbios. Não que pessoas com alguma desordem sejam de alguma forma menos humanas, mas falar delas não é uma maneira útil de discutir gênero ou sexo.

Existem dois gêneros, porque na natureza existem dois sexos. Eu sei que esta posição será extremamente controversa, e já posso ouvir a chiadeira. Mas, basicamente, todos os outros tipos de gênero ou sexo não fogem realmente desse binário, eles são na verdade alguma combinação de características masculinas e femininas. Um transgênero é apenas alguém biologicamente homem ou mulher que escolheu se identificar culturalmente como do sexo oposto. Eu não vejo problema nisso.

O que me preocupa é ver as pessoas insistindo que gênero não tem relação nenhuma com biologia, como se um velho barbudo no alto de uma montanha tivesse nos dado essas regras para a definição patriarcal de gênero. A verdade é que, desde muito novos, meninos e meninas exibem diferenças psicológicas, como qualquer um que já tenha sido pai ou professor de crianças pequenas sabe, e conforme crescemos e chegamos à puberdade, essas diferenças nos nossos cérebros se acentuam ainda mais. Não dá pra separar mente e corpo aqui. Mulheres e homens tem níveis diferentes de certos hormônios, os estímulos afetam seus cérebros de maneiras distintas, eles se comunicam diferentemente, e têm prazer em tipos de atividades diferentes. Não existe uma conspiração maléfica nisso, é simplesmente o modo como as coisas são. Pare de tentar desesperadamente ser especial e uma exceção, e aceite simplesmente que existem tendências gerais para os gêneros. Você deve fazer aquilo que lhe parecer mais natural, sem se preocupar em como isso deveria mudar a maneira como você se rotula.

Um coisa que eu odeio especialmente é o termo “genêro-fluido”.. pelo amor de Deus, você não é uma incrível pessoa “gênero-fluida” se é homem e gosta de bordado, ou se é mulher e gosta de caratê.  Você é apenas um cara que gosta de bordar ou uma mulher que curte caratê! Simples assim. O termo parece reforçar estereótipos, quando assume que se um homem ou mulher age de maneira não-estereotipada, eles só podem estar agindo “como um homem” ou “como uma mulher” devido a uma super-rara-mega-ultra- cool-identidade-de-gênero, faça-me o favor.

Crianças não têm preferências inatas que variam com o gênero/sexo

Todo dezembro as festas de fim de ano são marcadas por uma grande tradição feminista: reclamar dos brinquedos infantis. Você fica pensando se essas mulheres não tem nada melhor pra fazer do que reclamar de algo tão ridiculamente trivial. Afinal, as feministas vivem dizendo que o feminismo trata de questões políticas muito sérias, mas o que a gente mais vê é elas reclamando sobre: 
  • letras de música
  • uma camisa
  • lâminas de barbear/depilar
  • fantasias de Halloween
  • filmes da Disney
  • bonecas
  • Legos (o horror!)
  • árvores (talvez)
Quanto mais elas reclamam desses pseudo-problemas triviais, mais difícil fica levar as feministas a sério. Será que os brinquedos praticam sexismo? Brincar com Barbies faz uma lavagem cerebral nas meninas para que se tornem esposas submissas? Se qualquer outra pessoa dissesse que os brinquedos são instrumentos de lavagem cerebral infantil, ela seria chamada de louca, mas devemos concordar quando uma feminista diz que algum brinquedo é um instrumento dos homens para influenciar as meninas? Que diabos? 

Na realidade, o motivo pelo qual as fabricantes fazem os brinquedos desse jeito é por que equipes de pesquisa e desenvolvimento gastaram muito tempo e dinheiro testando seus produtos e vendo quais teriam mais chance de sucesso no mercado. Meninas parecem preferir naturalmente cores claras (como o rosa) e brincadeiras sociais e de cuidar. Elas também parecem preferir brincadeiras envolvendo imaginação e fantasia. Já os meninos parecem preferir brincadeiras violentas, de destruir coisas, e jogos envolvendo objetivos e estratégia. Meninos gostam mais de ação, e também gostam mais de ciência/tecnologia que meninas.

Quase toda criança será exceção em alguma dessas tendências gerais, claro. Quando eu era criança, por exemplo, eu achava Barbie muito chata, e adorava jogos de computador. No entanto, a tendência geral ainda é uma maneira válida das fabricantes preverem o que vai agradar meninos e meninas. É muito difícil, dadas essas diferenças inatas, criar brinquedos que agradem igualmente a meninos e meninas. E conforme meninos e meninas crescem, as diferenças também aumentam.

Videogames e cultura gamer = misoginia

(ver no artigo original em inglês)

Conclusão

Desculpem pelo tamanho do post. Se você gosta do meu trabalho, por favor veja meu perfil  e meus outros artigos – basicamente sobre anime no Hubpost e em breve mais artigos críticos ao feminismo no A Voice For Men. Não é minha política banir comentários, mas tente fazê-los razoáveis e respeitosos. Ninguém merece ser atacado só por discordar de você, embora eu me sinta quase convidando ataques só por ousar falar abertamente e dizer ao mundo o que eu realmente penso. Mas, se você não for maldoso comigo, não serei com você, então não hesite em comentar.


Sobre a autora: Rachael Lefler
Rachael é fã de anime e começou escrevendo um blog sobre o assunto, mas também se interessou em política e direito durante seus estudos na Illinois State University. Embora sua formação principal seja em História da Arte, ela pretende estudar Direito Internacional após a graduação. Seus interesses acadêmicos são variados, incluindo ciência, arte, psicologia, sociologia, línguas, história, literatura, direito e filosofia. 

domingo, 11 de janeiro de 2015

Como pesquisas mal feitas prejudicam a causa feminista


Em dezembro de 2014, foi divulgada a pesquisa “Violência Doméstica: o jovem está ligado?”, encomendada pelo Instituto Avon e realizada pelo Data Popular. Essa pesquisa, bem como sua repercussão em inúmeros sites de notícias, exemplifica muito bem a razão de ser do nosso Feminismo Racional. Ela traz alguns dados muito interessantes e preocupantes, mas também outros que não servem para tirar qualquer conclusão útil. Juntar dados bons com dados (ou conclusões) ruins acaba comprometendo a credibilidade da pesquisa como um todo, e matérias alarmistas sobre ela só pioram a situação.

A pesquisa foi bastante ampla, entrevistou grande número de homens e mulheres de 16 a 24 anos, de todas as regiões brasileiras. Ou seja, a amostra (pelo menos numa análise rápida) parece ser bastante representativa dos jovens  brasileiros, então os dados são confiáveis no sentido estatístico. Vejamos como o Estadão apresentou os resultados (alterei a figura com traços em vermelho para antecipar os problemas que serão discutidos adiante).


Os problemas começam com o conceito de “violência”. A pesquisa afirma que 66% dos homens admitem que praticaram “violência” contra a parceira, um número bastante alto. Porém, isso é um dado agregado; as perguntas originais foram sobre condutas específicas, e aí a situação já parece um pouco diferente. Na verdade, a maioria das supostas agressões foram condutas não necessariamente agressivas ou violentas: procurar mensagens e ligações no celular da parceira, xingá-la ou impedi-la de usar determinada roupa. As agressões “pesadas”, aquelas que todo mundo entende como violência, foram bem mais raras. Tenho plena consciência de que esses dados provavelmente estão subestimando o número de agressões, já que alguns homens simplesmente mentiriam na resposta (mesmo a pesquisa sendo anônima pela internet). Também sei que é importante conscientizar quanto a todo tipo de violência e desrespeito, não apenas a agressão física. Mas isso não é motivo para esticar tanto os conceitos de violência e agressão, a ponto de incluir bisbilhotar o celular da namorada... para mim, soa simplesmente exagerado. E eu acho que o tiro sai pela culatra: as pesquisas são feitas para conscientizar a população, mas o exagero acaba ficando evidente e isso dá munição para todo tipo de crítica ao movimento feminista.

Outro problema muito frequente nas estatísticas sobre questões feministas é a falta de parâmetros de comparação, e isso fica bem evidente na pesquisa do Data Popular. OK, agora sabemos quantos homens admitem ter agredido a parceira. Mas e quanto às mulheres que agrediram seus parceiros? A pesquisa nem perguntou! Está implícito que os pesquisadores acham que os homens xingam e agridem muito mais as parceiras do que são xingados e agredidos por elas. Será? (Pessoalmente, acredito que, no quesito agressão física, os homens agridem mais. Mas será que até nos xingamentos existe muita diferença?) Será que estamos diante de um quadro escandaloso de machismo ou simplesmente de agressividade e baixaria mútua nas relações amorosas entre jovens?

E agora, o trecho mais problemático da reportagem: “a maioria aprova valores machistas”. De onde eles tiraram isso? Ora, o machismo só poderia ser detectado pela diferença de tratamento entre os gêneros. A informação de que 53% dos homens e 49% das mulheres acham que “a mulher deve ter a primeira relação sexual com um namorado sério” só seria machista se tivéssemos uma porcentagem muito mais baixa (digamos 20%) que achasse que a primeira relação sexual do homem deve ser com uma namorada séria. Mas a pesquisa nem se interessou em perguntar isso! Ficou um dado solto e irrelevante, que não demonstra absolutamente nada sobre machismo. O mesmo vale para os 43% de homens e 34% de mulheres que concordaram que “mulher que tem relações sexuais com muitos homens não é para namorar”. Ora, será que isso é sinal de machismo ou mostra simplesmente um moralismo mais geral, talvez de base religiosa, quanto ao comportamento sexual? Será que os homens que “têm relações sexuais com muitas mulheres” são “para namorar”? A pesquisa do Data Popular perdeu uma ótima oportunidade de descobrir isso.

Quero deixar claro que não adianta nada tentar defender a pesquisa dizendo que ela era apenas sobre machismo e violência contra a mulher, e não sobre “femismo” ou violência nos relacionamentos. Os pesquisadores têm todo o direito de querer provar uma tese (por exemplo, de que existe um machismo galopante na sociedade), mas eles nunca conseguirão provar essa tese fazendo as perguntas erradas, ou deixando de fazer perguntas simples que forneceriam uma base adequada de comparação. Fico me perguntando se a omissão dessas perguntas foi apenas um amadorismo metodológico ou se foi proposital - é até possível que as perguntas tenham sido feitas, mas que os resultados foram omitidos por não apoiarem as conclusões desejadas por quem encomendou o estudo.

Por fim, vamos analisar a manchete em si: “3 em cada 4 jovens já foram assediadas ou agredidas por parceiro”. Primeiro, de onde saiu esse “por parceiro”? Se o jornal se refere aos 75% de mulheres que foram assediadas ou violentadas, como aparece na figura, não fica claro por quem elas foram agredidas, mas tenho quase certeza que não foi só pelo parceiro (seria estranho perguntar “você já foi assediada fisicamente em transporte público.. pelo seu parceiro?”). Infelizmente, os dados originais dessa pesquisa não foram disponibilizados em lugar nenhum até agora, então fica difícil saber o que foi falha da pesquisa em si e o que foi má interpretação do jornal. Continuando: leia novamente a manchete, tendo em mente que, nessa era de compartilhamento impulsivo de notícias, isso é tudo o que muitas pessoas lerão da reportagem. Ora, “assédio” é uma palavra muito subjetiva (dar em cima de alguém na balada é assédio?), e certamente menos grave que "agressão". Se você junta os dois numa só frase com esse fatídico "ou", muita gente vai pensar que quase todas essas jovens foram “apenas assediadas” e não agredidas, e achará que está tudo bem. Não seria melhor destacar na manchete um dado que não pudesse ser tão mal interpretado, por exemplo, a porcentagem de mulheres que já foram fisicamente agredidas por seus parceiros?

A pesquisa Avon/Data Popular está longe de ser um caso isolado. Muitas pesquisas com esses mesmos problemas têm sido usadas por feministas no mundo todo para apoiar suas teses. É crucial saber separar o joio do trigo. Mesmo as pesquisas ruins não são de todo ruins e costumam trazer dados úteis. Às vezes os dados são bons, mas a interpretação deles é ruim, até na pesquisa original, e piora quando essa interpretação é distorcida sucessivamente por feministas sem familiaridade com o método científico. Só com boas informações e análises poderemos saber onde estão os problemas reais das mulheres e o que fazer para resolvê-los, além de podermos informar melhor o público em geral. 

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Muito barulho por nada: a questão da “culpa da vítima” no estupro



Uma das polêmicas mais comuns nos debates sobre feminismo é a suposta “culpa da vítima” - também conhecida como “ela estava pedindo” - em casos de estupro. Veremos que essa polêmica toda é, em grande parte, apenas um mal-entendido quanto ao significado da palavra “culpa”.

A maioria dos homens argumenta da seguinte forma:
“Se um homem sabe que está numa vizinhança perigosa, não vai andar com relógio de ouro, falando num celular último modelo, vai? Se esse cara for assaltado, todo mundo vai dizer que ele deu bobeira, que é preciso tomar mais cuidado, etc. Ninguém vai tirar a culpa do ladrão, ninguém vai dizer que o playboy foi o culpado de tudo... mas diremos que ele contribuiu, que ele aumentou o risco de ser assaltado com seu comportamento descuidado. Da mesma forma, a mulher também pode aumentar ou diminuir o risco de ser vítima de estupro, dependendo do seu comportamento e roupas. Isso não é culpar a vítima, e sim reconhecer um fato óbvio.”

Já as feministas geralmente argumentam assim:
“É um absurdo culpar a vítima! O estuprador é o único culpado. A mulher tem o direito de se comportar como quiser, de se vestir como quiser..  nada disso significa que mereça ser atacada.”

Ao que uma pessoa sensata só poderia responder: Claro! Colegas feministas, parem de falar o óbvio! NINGUÉM está negando o óbvio, e vocês só parecem loucas raivosas quando falam como se houvesse alguma controvérsia real na questão da “culpa da vítima”.

Vamos ser claros: a pessoa que diz que roupa curta aumenta o risco de assédio não está dizendo que a culpa é da vítima, pelo menos não no sentido moral da palavra culpa!

Isso é um mal-entendido relacionado com os sentidos da palavra “culpa”. Se entendermos “culpa” como qualquer conduta que aumente a chance de ocorrer um evento, então sim, o assaltado quase sempre tem um pouco de culpa, assim como a mulher assediada/estuprada. Só nesse sentido é que você vai ouvir alguém dizendo (embora até isso seja raro no Brasil) que fulana teve “culpa” por ser estuprada. Porém, quando as feministas acusam alguém de “culpar a vítima”, o significado de “culpa” já passa a ser outro, mais comum e contundente: provocar conscientemente o resultado, “pedir” pra ter problemas, merecer. Ora, é óbvio que ninguém acha realmente que o fulano quis ser assaltado, ou que a mulher merecia ser estuprada, ou mesmo que qualquer um deles considerasse provável ser atacado naquele dia! Repito: NINGUÉM ACHA! Então também é óbvio que, quando uma feminista acusa alguém de “culpar a vítima” nesse sentido, está atacando uma afirmação fictícia que só existiu na mente dela, um mero espantalho.

O que muitas feministas fazem, com uma desonestidade intelectual assustadora, é pegar qualquer comentário que meramente sugira culpa do sentido leve/estatístico e automaticamente igualar isso a uma afirmação categórica de que a vítima é culpada no sentido pesado/moral! Assim, qualquer pergunta sobre a conduta da vítima (ela estava bêbada? como estava vestida?) logo se converte, na mente das feministas, em “ela estava pedindo” e “a culpa foi da vítima”. E assim as feministas repetidamente renovam esse espantalho para atacar até o fim dos tempos..